
Como na maioria das cortes européias naquele tempo, o palácio da Casa de Vasa era um viveiro de boatos. Os rumores sobre a morte do visitante francês somente se dissiparam aos poucos, mesmo assim, só quando a brilhante, irrequieta e jovem rainha ofereceu ao paÃs, e na verdade a toda Europa, um motivo de falatório muito mais excitante. Além disso, ninguém foi capaz de identificar um suspeito ou um motivo para o assassinato de Descartes, e assim a causa oficial da morte entrou nos livros da História, com os biógrafos comentando com tristeza o fim prematuro de uma carreira brilhante e a ironia de uma vida terminada em um paÃs tão longÃnquo.
Pouco depois da chegada, de Descartes mencionava numa carta que a sua permanência em Estocolmo seria curta, o que se revelou ser uma lúgubre profecia, sendo que só passou apenas quatro meses da sua chegada.
Agora vem uma parte interessante, sobre os restos mortais. Já tarde, a França reclamou os restos do seu ilustre filho. Em 1666, os ossos de Descarte foram exumados, colocados num caixão de cobre e transportados para Paris, onde ficaram sepultados na Igreja de Sainte Geneviève-du-Mont. Novamente desenterrados durante a Revolução Francesa, no fim do século seguinte, os restos mortais deveriam ser colocados no Pantheon, a imponente basÃlica dedicada aos pensadores e escritores notáveis do paÃs.

Em vez disso, o caixão de Descartes foi levado para Saint-Germain-des-Près em 1819. Antes de ser colocado, o caixão foi aberto, revelando uma descoberta macabra, faltava o crânio de Descartes. Posteriormente, este apareceu num leilão na Suécia, a cabeça foi cortada quando do 1º deslocamento dos restos mortais, pois sobre o crânio estava escrito: “Crânio de Descartes, apropriado e cuidadosamente conservado por Israel Hanstrom no ano de 1666, por ocasião da transferência do corpo para a França, e desde então escondido na Suécia”. Quem quer que fosse Hanstrom, sem dúvida era de opinião que o filósofo pertencia, pelo menos em parte, ao paÃs onde morrera. Mas o crânio foi levado para França, e desde 1878 encontra-se no Musée de L’Homme, em Paris. E até hoje a cabeça e o corpo permanecem separados pelo Rio Sena.

Ao visitarmos a Igreja de St. Germain-des-Près, no Quartier Latin em Paris, acostumando os olhos à pouca luz que as velas proporcionam, poderemos reparar numa placa de mármore preto no chão de uma capelinha lateral onde está gravado o nome de Renatius Cartesius, forma latina de René Descartes. Ali repousam os restos mortais do famoso filosofo, matemático e cientista, nascido em 31 de março de 1596 em La Haye, aldeia da Touraine, no Centro da França. e falecido em l l de fevereiro de 1650 na corte real da Suécia, em Estocolmo. Causa da morte, como oficialmente se anunciou e amplamente naquela época, pneumonia.
Tratava-se de uma carta escrita pelo médico da rainha Cristina, Johann van Wullen, a Piso, um conhecido médico daqueles tempos. “Como sabe”, escrevia Van Wullen a Piso, “Descartes chegou há vários meses à Suécia para prestar os seus respeitos a sua SerenÃssima Alteza a Rainha. Agora mesmo, quatro horas antes do alvorecer, este homem acaba de exalar o último suspiro... A rainha quis ver esta carta antes de eu a mandar, quis saber o que eu escrevera aos meus amigos sobre a morte do Descartes, e deu-me ordens rigorosas para que não deixasse as cartas cair nas mãos de estranhos.” Curioso não. E o Pies continuou a ler a carta antiga. O que se seguia era uma descrição detalhada da doença final de Descartes. Mas perguntou-se Eike Pies do por que razão o médico da corte sueca achou necessário escrever ao seu colega na Holanda sobre o andamento de doença tão comum como uma pneumonia? E porque se preocupou a própria rainha em censurar as notÃcias da morte do seu famoso hospede? Desejando outra opinião.Pies traduziu a carta, omitindo nomes, lugares e datas, e entregou-a para um patologista criminal. Veredicto, os sintomas descritos na carta de van Wullen eram os de envenenamento agudo por arsênico. Devido à s lesões que causa no trato intestinal, este envenenamento provoca enjôos e dores de estomago. As mucosas incham, os vasos sanguÃneos se rompem e o sangue, misturado com os ácidos gástricos, forma uma massa negra que é excretada pelos intestinos ou pela boca. Estes sintomas não são os que geralmente caracterizam uma pneumonia.
Há poucas probabilidades de se encontrar o culpado e é impossÃvel um julgamento de um crime acontecido há três séculos. Mas seria possÃvel obterem-se provas, pois o arsênico deposita-se nos ossos, unhas e cabelos da vÃtima e pode ser detectado muito depois da morte. Mas, aà vem a grande questão, o ser ou não ser, se deveriam os restos mortais de Descartes ser exumados mais uma vez? Muita gente protestaria contra mais esta violação e desrespeito com o morto, por tão remota possibilidade de se descobrir um crime praticado há tanto tempo.
Quanto a descobrir-se o culpado, se realmente houve crime na morte do filósofo, as esperanças parecem nulas. Contudo, Descartes fora o primeiro baluarte da investigação cientÃfica. Aplicando as regras que ele próprio estabelecer no seu Discurso do Método, poderia se dizer-se:
Questionando em que ponto as provas levam a crer ter sido envenenamento? A carta, ela é muito clara. Se fosse como anunciado por pneumonia os sintomas desta doença começa com arrepios e ataques de tremores, febre alta e fortes dores no peito, seguindo-se em geral sintomas como tosse, falta de ar e expectoração de cor ferruginosa. No entanto, a carta escrita na época pelo medico da corte, Johann van Wullen, a um colega holandês apresenta um quadro totalmente diferente do estado do filósofo, está até aqui no meu caderninho, eu vou ler o que a carta diz: “Durante os dois primeiros dias, ele dormiu profundamente. Não tomou nada, não comeu nem bebeu nada., e nem tomou remédios. No terceiro e quarto dias, esteve sem dormir e muito agitado, também sem alimentos nem medicamentos. No quinto dia, fui chamado para o ver, mas Descartes não quis ser tratado por mim.

Uma vez que os sinais de aproximação da morte eram óbvios, fiquei feliz por não precisar pôr as mãos no doente. Passados o quinto e sexto dias, queixou-se de tonteiras e de uma febre interna. No oitavo dia, apareceram soluços e vômitos negros; depois, uma respiração irregular e um olhar vago, todos prenúncios de morte. No nono dia, o descontrole era total.
E no décimo, de manhã cedo, ele entregava a alma a Deus.” ou seja, morreu. Esta descrição da evolução da doença terminal de Descartes condiz, na realidade, com os sintomas de envenenamento por arsênico, muito mais do que com os de pneumonia. Se acreditarmos na carta de Van Wullen, Descartes pode ter sido assassinado realmente assassinado. Está versão aparentemente é a mais próxima da verdade pura, só que isso sempre será uma axioma, uma verdade sem provas.
Envenenamento com Arsênico?
Se for, foi quase um crime perfeito.



